O assédio
moral é uma prática de difícil extermínio. Sua extinção é um trabalho cotidiano
que desafia os limites da resistência humana. Definitivamente, é um problema
social que afeta uma infinidade de pessoas mundo afora e à sociedade como um
todo.
Ocorre em
todos os níveis de relacionamento, mas ganha contornos dramáticos nas relações
de trabalho, sobretudo, naquelas onde há a assimetria de posições e funções.
À medida que
se discute o tema, em todos os setores da sociedade, a questão se circunscreve dentro
da verdadeira natureza de sua realidade.
Nem tudo o
que o empregador faz pode ser alegado como de origem perversa, a despeito da
vontade do empregado. Derivam da relação contratual os papéis estabelecidos
pelos critérios hierárquicos, onde ambos, empregador/ empregado, concordaram
com isso, quando assinaram o contrato trabalhista, ainda que seja um modelo
arcaico que ainda encontra adeptos entusiastas, e, portanto, sem perspectivas
de mudanças em curto prazo.
Não quer isso
dizer, no entanto, que o poder disciplinar resulte em sujeição, ou, que não
encontre limites. Seja na empresa privada quanto na pública a Norma tutela
Direitos e garantias, como também, estabelece os devidos deveres de ambas as
partes.
É o caso das
administrações públicas, como as de sociedade de economia mista, como a que eu
trabalho. Neste Blog, há quatro anos pelo menos, venho postando sobre esta
problemática, envolvendo gestores que se utilizam da coisa pública para
deflagrar processos persecutórios. Muita coisa aconteceu de lá pra cá, onde,
sem dúvida, houve avanços significativos, mas que não foram suficientes para
neutralizar comportamentos patológicos, de perturbados dissociais que se
incrustaram, há muito tempo, na empresa.
De fato, não
cabe ao Direito, que é heterônomo e coercível, entender o que se passa nas
mentes distorcidas de assediadores, mas, sim, estabelecer limites às suas ações
de uma forma ou de outra. Se não for pela adesão espontânea que seja pela força
da norma.
E está aí, a
razão e a origem das leis- delimitar o alcance do poder daqueles que são agentes
estatais e não, como supõem, a sua extensão.
Em postagens
passadas eu já alertava ao leitor sobre a minha descrença em acreditar que um
assediador crônico mudaria de comportamento, negando a sua natureza sórdida e
deturpada. Lembre-se: eles são antissociais.
Acontece que
na administração pública há inúmeros dispositivos para se cobrar a disciplina
de seus agentes, e que, nem por isso podem ser utilizados de qualquer forma,
muito menos, para atender aos caprichos indiscriminados daqueles que se desviam
de sua finalidade.
Imagine você que a coisa pública deva atender
ao interesse público e não ao interesse pessoal de um alguém qualquer. Isso
quer dizer que o motivo pelo qual um gestor público deve se ater para pretender
cobrar disciplina de um servidor, primeiro, passa por ele, que também é
obrigado a segui-la.
Em locais infestados
por parasitas públicos, isso não se vê. O que se tem por lá, é o arbítrio, o
desprezo pelos valores democráticos e em consequência, pelo elemento e
dignidade humanos.
É nessa hora
que os bandidos de colarinho branco manifestam o que aprenderam em seu mundo de
ilícitos e, hipocritamente, lançam mão da legalidade, através de inquéritos e
sindicâncias viciados, para perseguir seus desafetos. Ora, há uma lógica nisso
se pararmos pra pensar: se o camarada se corrompe e é corrompido, se viola
qualquer regra, por mínima que seja, não lançará mão de qualquer artifício que
lhe dê vantagens?
Esta corja que se traveste de servidor não atua só, porém, conta com seus parceiros e contatos
internos para atacar covardemente aquele que é mais vulnerável. Então, quando
operam sob o falso pretexto da disciplina, na verdade querem é se livrar de
seus desafetos.
No caso das empresas públicas, isso não é tão fácil assim, por conta dos
princípios que regem tais administrações: o chamado regime jurídico e os
princípios da administração pública, onde o da legalidade encabeça e dá forma
aos demais, como os de finalidade, motivação, razoabilidade,
proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica,
interesse público, eficiência, impessoalidade, moralidade, igualdade,
publicidade, probidade administrativa, julgamento objetivo, além de princípios
correlatos como os da presunção de legitimidade dos atos administrativos, e do
importantíssimo, devido processo legal, sobretudo, no que diz respeito a
sindicância e inquéritos.
Perceba,
então, que não é somente o “gestorzão Coroné” achar que vai botar no devido
lugar aquele sujeitinho que não baixa a cabeça pra ele e mandar seus lacaios
armar um processo administrativo qualquer, que não se defrontará com algo mais
forte que ele: a Norma. Aliás, é tudo o que ele repudia na vida, afinal, ele é o
manda chuva do pedaço e não acata nada, pois tem um “costas-quentes” que, como
diz, passará “uns pano” e, tudo bem.
Sobre isso
a doutrina ainda se fundamenta em um princípio basilar que é o da isonomia que
não permite a desigualdade de tratamento e se resume em tratar igualmente os iguais
e desigualmente os desiguais, na medida das desigualdades. De acordo com Celso
Antonio Bandeira de Mello “O alcance da igualdade não se limita a nivelar os
cidadãos diante da norma legal posta, seu respeito exige que a própria lei seja
editada em conformidade com a isonomia. Dessa forma,” não só perante a norma
posta se nivelam os indivíduos, mas, a própria edição delas assujeita-se ao
dever de dispensar tratamento equânime às pessoas”.
Continua
ele: “A lei e o ato administrativo não devem ser fonte de privilégios ou
perseguições, mas cumprir o papel de instrumento regulador da vida social, tratando
equitativamente os cidadãos. Diante da “politização” (em um sentido pejorativo)
cada vez mais acentuada da máquina administrativa, é muito comum o
estabelecimento de regras que, a despeito de se fundamentarem em diferenças
sociais, geram privilégios desproporcionais, afrontosos à isonomia”.
De fato,
em lugares assim, exige-se rigoroso cumprimento legal a uns, mas se faz vista
grossa a atos piores de outros, seja porque fulano é filho do chefe, beltrana é
amante do ciclaninho, o outro é parceiro de falcatrua e, objetivamente, nada
tem a ver, no fim das contas, com disciplina, mas com questões pessoais,
perseguição e assédio moral. Dessarte, aquele que acusa o outro de desídia, não
só faz o mesmo, como faz coisas piores ainda, e, isso, definitivamente não é
conexo com o princípio da isonomia.
De
qualquer forma, viver entre assediadores, corruptos, fraudadores e ladrões não
deixa de ser um aprendizado de vida, já que se é forçado a observá-los como a
animais em plena selva, que manifestam seus comportamentos intrínsecos e, se
descobre o que nos diferencia deles.
Resistir,
portanto, e lutar contra esse mal, é um ato de exercício de cidadania, pois que
não só faz emergir direitos e garantias tuteladas Constitucionalmente, como
sedimenta o espaço democrático aos demais, e, no caso da Administração Pública,
há o Interesse Público como ponto central da
questão.
Leia também: O Grave x O de menor gravidade - idiossincasias de gestões incompetentes
Raniery
questão.
Leia também: O Grave x O de menor gravidade - idiossincasias de gestões incompetentes
raniery.monteiro@gmail.com
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