Dia desses fui ao Guarujá passar um fim de semana e ao voltar pra casa comecei a observar o comportamento das pessoas que de forma arrogante faziam no trânsito algo muito parecido com aqueles países onde dirigir se assemelha a um verdadeiro caos.
Durante o passeio foi tocado num assunto sobre uma área de preservação ambiental que fora solapada pelos vereadores locais que possuíam informações e poder privilegiados para mudar as leis e, evidentemente, mudaram as diretrizes locais para, então, comprar os lotes e, isso, claro, na calada da noite. Aliás, o que falar de todo o lixo que é produzido pelo litoral brasileiro afora detonando todo o meio ambiente?
Ao mesmo tempo que reparava nas enormes mansões não pude deixar de reparar que o serviço público por lá é precário e me perguntei sobre a dimensão e impacto da corrupção local sobre a vida dos munícipes que inertes aceitam isso passivamente.
Por outro lado, tive que reconhecer que a submissão aos inescrupulosos e a adesão aos seus valores não é privilégio dos guarujaenses ou mesmo relacionado a alguma classe social. E, se você adere ao que é destrutivo e predatório não se sentirá à vontade com a sua consciência para reclamar quando isso te atingir.
Esse episódio me chamou a atenção para uma faceta da característica humana que responde por inúmeras mazelas mundo afora: a arrogância. Sob o domínio e controle do ego nos parecemos com animais selvagens e, como gado em disparada, atropelamos tudo a nossa frente sem medir as consequências de nossos atos, somente nos importando com nossos umbigos.
Uso o meu trabalho como referência, pois lá, os fatores que permitem que gente assim se prolifere são inúmeros e é objeto das observações de todos aqueles que não aceitam tais posturas antiéticas. É claro que é também uma parcela da realidade em que estou inserido, mas também é uma amostra do que ocorre pelo Brasil. Lá a arrogância e prepotência das pessoas extrapola os níveis aceitáveis dos lugares em geral.
Isso me lembra de um desenho animado dos stúdios Cartoon Network. Tem um personagem cujo nome é Máximo. A cada situação que motiva sua intervenção ele repete o bordão: " Eu sou o máximo". O engraçado que se trata de uma doninha que possui um senso superlativo de si e vive buscando os aplausos e admiração das pessoas. Agindo como o famoso agente da série Macgyver faz de tudo e encontra solução pra todas as coisas. Conhece Física, Filosofia, Matemática, Engenharia etc. Tudo ele sabe e, portanto, pode resolver qualquer problema desde que no fim ouça os aplausos.
O curioso é que encontro a encarnação deste personagem por lá onde trabalho. O camarada é o todo poderoso, o imprescindível, o insubstituível...o máximo! Sua opinião é a única que vale, seus tantos anos é que contam e não consegue se dar conta de que não passa de uma caricatura desatualizada em um mundo que está em frenética mudança.
Como são pessoas que se apossaram da coisa pública para usá-la em seu proveito encerram-se em suas fortalezas de pretensa superioridade projetando em cada sombra a ameaça de seus atos desonestos. Desta forma, qualquer um que aparentar alguma ameaça que os faça perder a oportunidade de parasitar a empresa será devidamente descartado. Sendo assim, em cada setor há alguém estrategicamente colocado para garantir que a engrenagem de um esquema sórdido continue girando à favor daqueles que sugam o interesse público.
Mas, pense: por que é que nós, seres humanos, nos achamos a última azeitona do pastel? O que é que nos faz acreditar que somos grandes coisas? O poder econômico, político, físico? Quanto tempo de vida, em média temos? Sessenta, setenta, ou, um pouco mais? Somos um sopro na existência. Ainda mais, em um universo de bilhões de anos. E, aliás, em relação à sua dimensão sequer somos tão significantes assim.
Que o sol, nossa estrela, e responsável pela manutenção da vida é gigantesca em relação à Terra, já sabemos, mas num universo vastíssimo e, ainda inexplorado há corpos celestes que desafiam nossa imaginação como a estrela VY Canis Majoris, maior estrela conhecida, hipergigante vermelha localizada na constelação do Cão Maior, faz nosso planeta parecer um grão de areia. A estrela tem o volume de dois bilhões e 940 milhões de Terras.
Mas, se pensamos que coisas gigantescas seriam suficiente para ligar nosso painel de bom senso que dizer de seres microscópicos, invisíveis a olho nú, mas que podem nos devorar em menos de 24 horas. A cada dia surgem inúmeros tipos de super-vírus e superbactérias resistentes aos antibióticos que evoluem no mesmo compasso que a indústria farmacêutica e que desafiam as mentes mais brilhantes e seus poderosos centros de pesquisa matando milhares de pessoas por todo o globo.
Nada disso, porém, é suficiente para coçar a consciência de seres humanos que se acham o centro do universo, intocáveis, inatacáveis, que se endeusaram em rituais de narcisismos e autoglorificação. Se achando onipotentes, onipresentes é eternos andam por aí como se ao toque de seus dedos tudo e todos os adorarão. Mas, conforme o autor de Eclesiastes (3:19) disse: "Porque o que sucede aos filhos dos homens, isso mesmo também sucede aos animais, e lhes sucede a mesma coisa; como morre um, assim morre o outro; e todos têm o mesmo fôlego, e a vantagem dos homens sobre os animais não é nenhuma, porque todos são vaidade." Aliás, pra onde essa gente vai de nada adiantaria levar toda riqueza conquistada por meios sujos, mas terão que prestar conta disso de qualquer forma. Cada um com os seus problemas, não é?
E assim caminha a humanidade que mais parece que está revertendo os processos da evolução, tanto que vendo um documentário na TV a pesquisa buscava demonstrar o quanto somos parecidos com nossos parentes primatas do ponto de vista comportamental. É triste pensar que abrimos mão de nossa vantagem evolucionária, com um cérebro mais complexo, consciência de si para nos nivelar a chimpanzés levados e dominados por nossos egos.
Quem sabe o caminho de volta aos eixos não seja a humildade, coisa muito difícil de desenvolver em uma sociedade consumista, movida por valores superficiais que prometem a felicidade sem, contudo, poderem cumprir, já que é algo que não se encontra fora de nós, isto é, em coisas ou objetos, mas dentro de nós.
Olhando pra trás nesses anos em que fui submetido ao assédio moral em meu trabalho, o que enfrentei, de fato, foi esta falha de caráter do lodo humano que se criou naquele lugar. Pensando bem, eles sequer sabiam que estavam assediando, de certa forma, mas estavam sendo eles mesmos, daí ficarem indignados quando me recusei a aceitar os abusos cometidos. Mas, hoje, os pobrezinhos de espírito estão bem instruídos de que sua inadequação social não os isenta da culpa, ou melhor, dolo.
Portanto, se conclui que a arrogância é um fator determinante em muitas situações da dinâmica humana que temos dificuldade em controlar seja em nós, muito menos nos outros. Não significando dizer que é justificativa para que aceitemos abusos decorrentes de tal distorção de caráter, mas nos possibilita entender como ocorrem determinados processos e que providências devemos tomar uma vez detectado a subjetividade por trás deles.
Acredito que reconhecer a arrogância seja de que lado for exige de nós uma dose de humildade e como diz o mestre: "Porquanto qualquer que a si mesmo se exaltar será humilhado, e aquele que a si mesmo se humilhar será exaltado." Lucas 14:11
Leia também: Por que nós juízes somos arrogantes
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Raniery
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