Pular para o conteúdo principal

Humanidades

Que todos nós somos uma coisa na frente dos outros, e outra quando estamos sós, a psicologia já demonstrou a muito tempo. Basta observar nas redes sociais: todo mundo é legal e quer parecer desse jeito. Ninguém tem defeito, somos todos corajosos, cidadãos, engajados, amigos etc, mas basta dar licença ao mundo virtual e cair no real que as coisas se mostram como são.

Como mecanismo de defesa, o ego cria uma persona exterior falsa - uma máscara que ele apresenta ao mundo exterior como se fosse real, mas que na verdade esconde a verdadeira natureza do indivíduo.

Renato Russo já dizia em suas canções: “O senhor da guerra não gosta de crianças e a humanidade é desumana e é só o amor que conhece o que é a verdade”

Mas, veja você a que ponto chega quando aquilo que era pra ser somente um mecanismo de sobrevivência se transforma em um mecanismo de monstruosidade ou uma distorção desproporcional desse importante instinto.

Um menino chinês de seis anos foi drogado e teve os globos oculares extirpados para um suposto tráfico de órgãos, um crime selvagem que provocou uma onda de indignação no país.


Os casos relatados são de uma crueldade sem paralelo, ainda mais, em se tratando de crianças, mas isso não é novidade, pois historicamente os infanticídios ocorrem e ao que parece acompanham e mancham nossa humanidade. 

Quando tomamos ciência de coisas assim, ficamos horrorizados e nos perguntamos como alguém poderia ser capaz de tais atos hediondos. Perceba que é preciso uma frieza fora do comum, total falta de escrúpulos e um alto índice de crueldade/ perversidade para produzir tais crimes. É preciso romper com todo e qualquer laço de moral, emoção/sentimento para ser capaz de maltratar uma criancinha inocente.

Isso acontece quando rompemos com nossos laços evolucionários e agimos de forma egocêntrica e anti-social. Se os casos narrados nos deixam perplexos em relação a natureza humana, por outro lado, revelam que quando se nada contra a maré evolucionária, isto é, a capacidade de socialização, coisas do tipo acontecem. E não é preciso chegar aos requintes de crueldade acima descritos. Basta que consideremos determinadas possibilidades de romper com a ordem natural das coisas, para que todo tipo de dano ocorra, seja leve, médio, ou mesmo grave, como o de crimes bárbaros. É uma questão de consciência.

Já que tocamos no assunto consciência, dia desses li um post que despertou minha curiosidade sobre uma história com um nome diferente realizada por um antropólogo que fez uma experiência numa tribo africana. Ele deixou um cesto de doces debaixo de uma árvore, chamou algumas crianças, e propôs uma corrida até as guloseimas - quem chegasse primeiro teria o direito de comê-las sozinho. Mas, para sua surpresa, quando deu a largada todas as crianças deram as mãos e saíram correndo em direção à arvore. Chegando lá, começaram a distribuir os doces entre si, e a comerem, contentes. O antropólogo, então, perguntou por que elas tinham ido todas juntas, se uma só poderia ter ficado com tudo e, assim, comeria muito mais doces.  E as crianças simplesmente responderam: Ubuntu, tio!. Como uma de nós poderia ficar feliz se todas as outras estivessem tristes?”

Ubuntu significa: Sou quem sou, porque somos todos nós

Ubuntu fala sobre a noção de comunidade que, infelizmente, muitos de nós perdemos pelo caminho, em algum momento. É aquele sentimento de solidariedade, gentileza, respeito, tolerância e pertencimento que faz das relações, atitudes e comportamentos humanos experiências ricas, únicas, transcendentais.

Para o arcebispo Desmond Tutu, prêmio Nobel da Paz, Ubuntu é um dos presentes da África ao resto do mundo. Envolve hospitalidade, cuidado com os outros, ser capaz de dar um passo a mais pelo bem dos outros. Acreditamos que uma pessoa é uma pessoa através de outras pessoas, que minha humanidade está vinculada indissoluvelmente à sua. Quando desumanizo você, inexoravelmente me desumanizo. O ser humano solitário é uma contradição. Em termos, portanto, trabalhe para o bem comum porque sua humanidade vem de sua própria condição de pertencer, diz ele.

Percebeu? Talvez seja difícil, já que somos programados desde cedo a sermos competitivos e a ganhar o primeiro lugar, sermos campeões, o número um. Fomos treinados para consumir e descartar, para ter, possuir e não compartilhar, dividir. Sendo assim, vale tudo para que consigamos atingir nossos objetivos e, nesse afã, nunca nos satisfazemos. Olhamos pro lado, e não ficamos felizes pelo outro que está prosperando, mas o invejamos e lhe desejamos o mal. Quando um revés o abate, logo ficamos eufóricos, pois assim nos projetamos, já que não conseguimos lidar com nossas distorções mandamos nossos demônios pessoais sobre o próximo culpabilizando-o por nossos fracassos.

Com esse sentimento relativizamos nossos atos e passamos a considerar possibilidades desonestas para pegar um atalho no meio do caminho e então,....possuir. Se for preciso, roubaremos; se houver oportunidade, fraudaremos; se nos permitirem, nos prostituiremos, desde que, consigamos aquela vantagem. Uma vez rompido os portões da ética e da moral nada nos impedirá de cometer qualquer ato ilícito ou desabonador. No caso do garotinho chinês, o monstro vislumbrou uma vantagem econômica em arrancar seus olhos e vender suas córneas a alguém que não é muito diferente  já que as comprou.

Guardada as devidas proporções, o que vemos em nossas realidades é um monte de gente fraca e débil que se vende a preço de banana violando a si mesmas e perdem sua capacidade de enxergar, pois foram entenebrecidas e consumidas pelos seus desejos tortuosos; passam a ser cegos que guiam outros cegos e como já disse o mestre: se a luz que está em ti são trevas, quão trevosos são os teus passos. 

Mas, nem tudo está perdido, pois ainda tem muita gente boa neste mundo, que oferece mais do que toma, que acaba sendo uma fonte inspiradora. Infelizmente, as pessoas de/do bem se escondem e permitem que os perversos ocupem seus espaços disseminando o mal no mundo. Não é o caso das pessoas abaixo:

Um projeto ainda em fase experimental em Santa Cruz do Sul, na Região do Vale do Rio Pardo, no Rio Grande do Sul, pretende reduzir a circulação de veículos com tração animal. O 'cavalo de lata', como vem sendo chamado, é instrumento de trabalho dos recicladores cooperativados do município. A estrutura metálica com carroceria para levar o lixo foi criada com a finalidade de acabar com a exploração dos animais e qualificar o trabalho dos catadores.

Já o outro caso é de uma daquelas pessoas que demonstram que não há problema que impeça alguém de conseguir o que quer na vida. Nataly é uma cadeirante, acadêmica de Direito e atleta paralímpica que representa o Brasil em competições de bocha. Só ela sabe a luta e os sacrifícios que enfrentou e ainda enfrenta na vida, mas nem um único dia eu vi essa moça deixar de sorrir. Pra quem acha que forte é quem pratica artes marciais, ou faz musculação, tente estar no lugar dela e ainda continuar firme e, sorrindo.

O terceiro é formado por um grupo de amigas que provam que o amor e a amizade é a mais poderosa fonte de energia do universo, pois se conheceram na adolescência, numa escola técnica, e até hoje mantêm uma sólida amizade que vence o tempo e a distância. Nem todas as fases da vida foram capazes de romper os laços que as unem.

Esses exemplos são muito mais fortes que qualquer outro de gente que optou por fazer o mal ao próximo. Com certeza, no Brasil e mundo afora, há muito mais gente boa que ruim, mas que deveriam arregaçar as mangas e tomar nas mãos este mundo que precisa tanto dos seus exemplos para tentarmos resgatar uma humanidade que parece se perdeu.
Raniery






raniery.monteiro@gmail.com
@Mentesalertas
http://mentesalertas.wordpress.com/

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Ninguém chuta cachorro morto

A expressão significa que as pessoas não atacam quem não tem valor, é insignificante, medíocre, mas alguém que possui características ou qualidades que incomodam e por isso as ameaça, daí porque utilizarem deste recurso numa tentativa de a diminuírem de alguma forma ao mesmo tempo em que se projetam. É da natureza de determinadas pessoas, que por uma inadequação interna, sentirem-se inferiores a outras, não pela suposta superioridade destas, mas pelo seu desajuste psicológico. Por isso, para alcançar o equilíbrio de seus centros emocionais praticam uma espécie de projeção imputando ao alvo de sua fúria seus próprios fantasmas internos. Este recalque as leva, então, a inventar boatos, viver em mexericos pelos cantos, disseminar a intriga e semear a discórdia contra a pessoa que vêm como sua competidora natural. E como se sabe que o problema é do desajustado? Simples: percebendo que a cada momento se elege um novo candidato ao posto de alvo. Sempre alguém não prestará ou será

Eu, eu mesmo e...somente eu!

Nada é mais difícil de lidar que uma pessoa narcisista . Elas se acham a última azeitona da empada e acreditam que as pessoas existem para lhes servir.  Se arrogância pouca é bobagem, imagine, então, um ambiente que lhe proporcione manifestar a totalidade de sua megalomania. No filme de animação, Madagascar, há dois personagens que traduzem perfeitamente o estereótipo do narcisista: o lêmure, rei Julian e Makunga o leão ambicioso e ávido pelo poder. O rei dos lêmures, Julian, se ama e se adora e acredita firmemente que tudo acontece em sua função. Com uma necessidade incomum de ser admirado faz de tudo para aparecer e chamar a atenção. Já o leão Makunga encarna o tipo de vilão asqueroso, dissimulado e traiçoeiro que sempre está planejando algo pra puxar o tapete do leão alfa. Nas relações onde o assédio moral é forma de interagir, tais figuras estereotipadas e sem noção aparecem por trás de atos inacreditáveis de egocentrismo crônico.  Não podem ser contraria

Cuecão de Couro?

Se a vida imita a arte eu não sei, mas em 1994, na comédia pastelão Ace Ventura Detetive de animais, a vilã Tenente  Winky no final da trama é desmascarada e ...bem, assista ao filme. De qualquer forma, tão surpreendente quanto a inusitada cena foi a confissão de um Seal americano através de uma rede social- ele trocou sua foto em seu perfil pela de uma mulher alta, morena, com uma blusa branca, sorrindo diante de uma bandeira americana. E escreveu: "Tiro agora todos os meus disfarces e mostro ao mundo minha verdadeira identidade como mulher". Chris Beck trabalhou 20 anos no Navy Seals, um comando especial da Marinha dos EUA que frequentemente faz operações secretas em territórios inimigos. Mas ao longo desse período o oficial guardava um segredo pessoal: desde a infância, ele sentia que era uma mulher nascida em um corpo masculino. Leia mais... Quem imaginária nos seus mais loucos sonhos que um camarada machão como esse escondia uma princesa desesperada por carin